terça-feira, 11 de março de 2014

Abduções, fugas e novelos de lã puxados.

Na casa onde o silêncio traz a lembrança de tantos anos, e tantas emoções vividas, uma específica me vem a mente, quando criança sentava na varanda e olhava para o prédio de seis andares que fica em frente, e desejava com toda a fantasia infantil subir ao seu  topo e abrir os braços, fechar os olhos, e esperar por segundos apenas, que aparecesse uma nave e pousasse sua luz sobre mim, me levando sem volta à uma viagem pelo universo, e eu pudesse ver de perto as estrelas e galaxias que fitava por horas deitada numa rede no quintal. Sim, eu sempre quis fugir, havia também uma ideia ainda mais antiga de que eu poderia por em minha mochila escolar três ou quatro calcinhas, umas revistinhas da turma da mônica, shorts,camisetas e biscoitos e enfrentar o mundo onde ninguém soubesse meu nome. É, eu sempre quis fugir realmente;
Sou dada às fugas, elas me atraem fortemente, pensamentos e memórias seletivas fazem parte desse contexto, dessa característica tão minha, que quando minha mãe como várias outras mães , ameaçava em seu nível de estresse hard, que um dia iria embora e nunca mais ninguém saberia dela, acontecia uma identificação que poucas vezes senti ter com ela. Sou daquelas que mora só e foge de casa, por dias...
Fiz isso novamente esses dias, fugi e vim para o lugar de onde sempre sonhei em fugir, ironia também combina muito com minha vida. 
As vezes sinto que vim com uma falha mental que não me permite criar planos e executa-los da forma correta, ou sequer executa-los, eu vivo tudo na mente e o que acontece é um acaso desordenado que de uma forma ou de outra dá certo, principalmente quando não dá.
Nunca compreendi ou pude guiar-me por nada exato, linha, reta, traço, régua, somas. Tudo é um emaranhado novelo de lã mental, puxa-se um fio e gera-se a incapacidade de retorna-lo ao seu espaço anterior, embora depois de puxado haja uma gama de possibilidades para aquele pedaço separado, e eu sei  disso, apenas não descobri ao certo o que fazer com ele. 
Os meus excessos, minhas compulsões, minha auto destruição continuam, e fodem não só a mente mas o corpo, é minha forma de sentir a vida. É intenso e triste ver quem amo se afastar, ou sofrer por não desejar presenciar meu modus operandi  de vida. Mas, que merda! Não sei ser diferente, não sei se quero, mas tenho as contas, tenho os afetos, tenho as dores na garganta, e na cabeça para me preocupar;
Ainda sou a menina que via o topo do prédio mais alto da cidade, em frente à casa da minha avó e sonhava dormindo e acordada com abdução. Ainda penso em fugir, mas hoje não me bastariam bolachas, revistinhas shorts, camisetas e calcinhas, o mundo se alargou, cresceu, ficou lindo e horrível ao mesmo tempo, e por incrível que pareça, pequeno. Não tem como fugir de você mesmo ainda que em Jeri, ou em Marrakesh. 
Minhas raízes que foram arrancadas desde o nascimento sempre pelejaram para se alimentarem , se situarem, para estarem onde estão, mas nunca consegui, talvez um dia, talvez não. Quem sabe?



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